Já não sei nada de ti. Por onde andas, o que tens feito, como tens passado…nada.
Outrora, num tempo paralelo a este, sabia todos os passos que ansiavas dar pois gostavas de mos contar assim que os tinhas em mente. Porém isso foi há muito, muito tempo – quando te conhecias de um modo antagónico ao de como te vês agora. Eu já devia saber que chegaria o momento de te ver partir como o Sol ao fim do dia, todavia os passos singulares que deste sozinho – sem aprovação minha – tomaram-me de surpresa como chuva de Agosto.
Não soube ao certo como responder a este teu acto tão autónomo e sobrecarregado de firmeza, contudo pressuponho que facultar a tua decisão ao colocar chão firme no teu caminho para que te movesses sem o risco de cair foi, de longe, a melhor reacção a exibir. O choque que te assomou e que se fez notar pela contracção repentina do teu rosto não foi, decerto, maior que o meu. Lamento se guardaste como última recordação minha o sorriso rasgado que te exibi e teres julgado que desse modo, tal como tu, tomara noção que a expressão do nosso amor tornara-se irredutível demais para tornar a ser investigada. Não arranjo explicação para o modo como permaneci em pé, de mãos repletas de feridas derivadas do soalho escuro que construí para ti até um ponto onde a minha vista já não te alcançasse e a minha cabeça tomasse consciência que a partir daquele instante serias só tu e a estrada, e eu e a solidão.
O meu coração, mesmo antes de analisar por completo a situação, foi golpeado de facadas sucessivas até não existirem réstias de margens sem úlceras. Por fim, assim que o teu corpo tomou a forma de um minúsculo vulto a mover-se de encontro ao grande astro dourado e desapareceste, pude sentir os ferimentos profundos que se alastravam do meu companheiro sofredor para o que ainda restava de mim.
As minhas feridas – aquelas que te são irrevogavelmente desconhecidas – têm sangrado tanto que chego a questionar-me da quantidade de sangue que predomina no meu corpo. Cada gota encarnada desde líquido espesso e infindável que derramo é um fragmento de uma memória de um período que agora te deve ser alheio mas que a mim dilacera impiedosamente. Como se nunca parasse, como se nunca existisse a altura de por fim, receber a presença de feridas cicatrizadas que em mim abandonaste.